05 setembro 2014

Resenha - Amores Inversos (Hateship, Loveship)


A primeira coisa que se pode dizer sobre Amores Inversos, adaptação do conto Ódio, Amizade, Namoro, Amor, Casamento, de Alice Munro, atual ganhadora do Nobel de Literatura, é que é, definitivamente, inesperado. Não só pela atuação dramática como protagonista da Kristen Wiig, de comédias como Saturday Night Live e Missão Madrinha de Casamento, mas também porque é um desses filmes que não é possível resumir a história numa sinopse. Os fatos que acontecem, apesar de muito bem amarrados, não seguem a linha óbvia com a qual nos acostumamos, com desenvolvimento, clímax e tudo mais, e é difícil até mesmo definir a qual o gênero ele pertence.

Para aqueles que não leram o conto e preferem ficar sem spoilers, o pouco que dá pra dizer é que o filme conta a história de uma mulher que é cuidadora de idosos e que, depois da morte da mulher para quem ela trabalhava, vai ter que cuidar de uma adolescente que mora com o avó ausente e cujo pai está tentando reconstruir a vida em outra cidade. A partir daí, o desenvolvimento de tramas e acontecimentos se dão num efeito dominó. Essa forma de escrita, em que uma cena leva à outra, ao invés de serem conectadas por ganchos, dá ao filme uma noção completamente natural. É graças à história ser tão boa, porém, que, diferente de muitos filmes indies com o mesmo modelo, o filme não parece ser ser rumo. Ainda sim, isso não significa que se trata de um filme fácil.

A reconstrução parece ser o que norteia esse filme, não só pela estrutura do roteiro. A já citada atuação de Kristen Wiig é tão bem dosada, que é difícil de acreditar que a atriz é comediante ao invés de reclusa e comedida como a personagem. Toda a história vai, a cada cena, em uma direção completamente nova e inesperada, mas ao mesmo tempo o clima estético do filme é sempre de corriqueirismo, dando a impressão de se tratar de uma história comum de pessoas reconstruindo suas vidas, dessas que ouvimos da avó sobre um parente num domingo de almoço.

O grande trunfo do filme é esse: mostrar histórias que parecem beirar à realidade e que, apesar de serem difíceis de funcionarem, passam a dar certo ao longo do tempo. É uma visão diferente da que geralmente filmes imersivos à realidade alheia passam, em que mostrar a realidade vira sinônimo de comover a partir do infortúnio alheio. A oposição que Amores Inversos faz a essa visão é tão suave, que não se oporia a ela até o mais pessimista. Só basta saber se ele não se incomodar com um filme que, apesar da história nada extraordinária, é tão pouco comum.